“Ser impecável com a própria palavra é empregar corretamente a sua energia e usá-la na direção da verdade e do amor por você mesmo” – Don Miguel Ruiz – Os Quatro CompromissosToltecas
Desde que aprende a falar, o ser
humano utiliza as palavras exaustivamente, falando por falar, na maioria das
vezes dizendo coisas sem significado e importância. Apenas pelo gosto de não
precisar se confrontar com o seu tagarelar mental e não se sentir sozinho
consigo mesmo, confrontando-se com um vazio que lhe parece sem sentido.
Então entrega-se a um passatempo que
vai do inútil “jogar conversa fora” até a nociva fofoca. Disseminar informações
cuja veracidade não podemos comprovar ou, pior, que absolutamente nada
acrescentam em benefício de quem quer que seja, é uma das piores formas de
envenenamento mental através da palavra. Envenena também porque influencia, com
a palavra descuidada e leviana, a opinião de terceiros. Conquistar a opinião de
terceiros significa o apoio para o próprio ponto de vista que nos confere a
ilusão de engrandecimento e poder.
A Palavra é um atributo da mente humana, única
espécie capaz de se manifestar, comunicando e expressando uma intenção.
Impecável é uma palavra com origem latina – impecabille - cujo
significado é “incapaz de pecar”.
A palavra pecado deriva do latim ‘peccatum, i’ , que significa “delito”(do verbo ‘pecco, as, vi, ātum, are’),
tropeçar , dar um passo em falso, enganar-se. Em grego é “hamartia” -
errar o alvo, sair da rota.
Impecabilidade significa “sem pecado” Então, a
Impecabilidade da Palavra seria a capacidade de utilizarmos esse maravilhoso
instrumento à serviço do melhor nível que o nosso caráter possa atingir e não
contra nós mesmos – que é o alvo onde refletem todas as nossas intenções e
ações .
A linguagem verbal,
como manifestação do pensamento racional, é o principal instrumento de
comunicação da mente humana. Instrumento que, devido a conotações subjetivas dá
origem a mal-entendidos, mas, ainda assim, tem sido extremamente útil como
expressão do conhecimento.
A existência de uma
suposta “palavra de Deus” é uma consideração bem recente na História da
humanidade. Embora os Vedas sejam reverenciados como uma escritura sagrada,
ninguém considera que tenham saído, literalmente, da “boca” divina. O
verdadeiro livro Divino, dada a extrema complexidade não linear da Manifestação
Universal, não caberia nas limitações da comunicação verbal. Sua linguagem é
simbólica. O “livro” é a própria Natureza Cósmica.
Na área devocional o
ser humano tem, desde sempre, se utilizado da palavra para melhor canalizar e
expressar suas emoções, chegando ao ponto de materializa-las com mais
eficiência. Bênçãos e pragas pertencem a todas as culturas.
A vivência comprova
que, quando focalizamos nossa mente em algo, e a isto somamos o sentimento e a
emoção para finalmente expressá-lo verbalmente, estamos exteriorizando e
materializando um Poder capaz de afetar a dimensão material densa.
As tradições
espirituais do Hinduísmo e do Budismo utilizam mantras como técnica meditativa
para alcançar determinados estados mentais. Já a yorubá, que tem suas raízes na
mais remota antiguidade e foi, até os últimos séculos, exclusivamente oral,
utiliza três modalidades principais que poderíamos denominar genericamente
“rezas”:Oriki (invocação),Adura (louvação)
e Ofó (encantamento).
A intenção dos Oriki
e Adura é facilitar a conexão com o Divino. O Ofó (encantamento) direciona uma
intenção. Considerando a boca um dos mais potentes transmissores de energia, o
Ofó pronunciado e acrescido de elementos de magia dos diversos elementos da
Natureza tem grande poder de concretização.
Diante da energia
liberada em cada palavra que pronunciamos, podemos nos conscientizar de que
elas afetam não só a quem as dirigimos, como também a nós mesmos. Alguns
psicólogos chegam a afirmar que “tudo o que dizemos aos outros, primeiramente
estamos dizendo a nós mesmos”.
Em decorrência desse enorme Poder,
é importante essa conscientização da influência da palavra tanto para o Bem
como para o Mal, pois pode se tornar um veículo de Justiça ou de Manipulação.
Promove tanto a Conciliação quanto alimenta o Conflito.
Expressão do nosso livre arbítrio,
ela é capaz se mudar nosso destino e o de nações inteiras.
Se por um lado a Palavra, como fonte sublime da
poesia, atinge o auge da expressão da inteligência, sensibilidade e
criatividade da nossa espécie, pode se tornar também um perigoso instrumento
escravizador.
Como vemos no mito bíblico da Torre de Babel, a palavra mal empregada tornou-se
um obstáculo ao entendimento, promovendo guerras. A palavra não só liberta,
como também é capaz de captar ideias à ponto de transformá-las em agentes da
mentira e da opressão.
Palavra Impecável é a que só
transmite aquilo em que se acredita, ou seja, a sua própria Verdade, uma vez
que esta, fora da realidade factual, é opinião relativa e depende do foco.
Opinião é apenas opinião e raramente nos deparamos
com a Verdade absoluta, mas apenas com opiniões. A Verdade não precisa de quem
a defenda e dispensa que se diga : eu estou certo e vc errado.
Este primeiro Compromisso é talvez o mais difícil de ser honrado e interage com
todos os outros. Por isso, é importante que atentemos para o mau uso da
Palavra, que pode requerer muitas frases para construir algo positivo e uma
única para tudo destruir.
A motivação inconsciente por trás do ego é estar sempre fortalecendo a imagem
que paulatinamente construímos de nós, pois todas as suas atividades são
governadas pelo medo de não ser alguém.
Na esfera cotidiana podemos
considerar a mente como um terreno fértil onde sementes são plantadas
continuamente. O seu desabrochar só depende de nós.
Segundo os estudos de Eric Berne que geraram a
Análise Transacional, o estado de consciência denominado Ego Pai é formado a
partir das primeiras influências de pais/cuidadores da criança não só através
de gestos e atitudes, mas grande parte também através de normas, valores,
conceitos, regras e programas de conduta expressados verbalmente. Assim se
formam opiniões, ideias e (pré)-conceitos emitidos e replicados ad
infinitum. A pessoa acaba – sem refletir se naquilo acredita ou não –
repetindo o que, durante anos, ouviu.
O medo, que é o ponto central do nosso drama
terrestre - que é o medo da não existência, a dor da própria finitude, de saber
que nenhuma forma é permanente e que tudo e transitório.
Impecabilidade
é ser coerente perante a Verdade do seu coração. É ter a idoneidade de
assumir a responsabilidade por todos os atos, sem se julgar ou culpar, sem
atribuir culpa a outras pessoas ou a fatores externos.
Ser impecável é amar
e respeitar a si próprio, pois a auto-rejeição significa a destruição da
própria vida.
No nosso Trabalho com o primeiro
Compromisso Tolteca à Luz da Ayahuasca contamos com seu Poder Aliado para
detectar, reconhecer e começar a superar toda a nossa falsidade em torno da
utilização da Palavra, como primeiro passo para a Libertação rumo a uma vida
mais pacificada – e agradável.
No decorrer da vida, palavras capazes
de captar nossa atenção vão nos influenciando, podem alterar nosso
posicionamento no mundo e também influenciar outros.
Não há possibilidade de Iluminação,
ascensão espiritual (ou como é moda se dizer hoje em dia: mudar o DNA ) se não
nos libertarmos desses padrões de comportamento – a começar pela Impecabilidade
da Palavra – reflexo do medo atávico.
Não há passe de mágica para
transcender esse nível de falsos condicionamentos que fazem da nossa estadia
neste planeta uma batalha incessante que só nos leva a frustração e ao
sofrimento.
Por ser tão difícil limpar o veneno
emocional de toda uma vida programada pela insegurança e pela auto-rejeição, a
Ayahuasca pode ser um valioso instrumento de trabalho para uma clara
autoanálise. Se existir, evidentemente, o desejo sincero de se entregar a essa
empreitada.
Com a finalidade de autoexame se reconhecendo
dentro da nossa mais profunda intimidade, examinamos alguns pontos
recorrentes:
Mal entendidos - com relação as palavras vem
do fato de pensarmos que ao vincularmos um termo a uma determinada coisa,
captamos o seu significado e sabemos o que ela é. No entanto, essa palavra é
apenas um rótulo. Rótulos verbais tornam a realidade mais superficial e vazia,
podendo transmitir informação, mas nunca pleno conhecimento.
Ofensas - ser
impecável com a palavra significa, em primeiro lugar, não revertê-la contra si
mesmo. Se a palavra ofensiva contra mim chega ao ponto de me ofender, é porque
me identifico emocionalmente com ela. Estou dando crédito e me envenenando com
essa energia. Da mesma forma, se me deixo empolgar com elogios que me
envaidecem, mas que, na verdade, bem sei que são desproporcionais e não
correspondem a realidade que só eu conheço. Há que ter cuidado com as
palavras alheias para que não se incorporem ao nosso sistema de crenças.
Críticas – como o ego
está permanentemente lutando pela sua sobrevivência e supremacia, precisa se
fortalecer. Esse fortalecimento depende do seu oposto: o outro, o “oponente
inimigo”. Dentro desse padrão egoico da consciência surge a compulsão de
diminuir, de encontrar defeitos nos outros a fim de ganhar força e
superioridade. É preciso que se atente para comentários “inocentes” que
mencionam fatos ou aspectos desabonadores a respeito de terceiros, por vezes
até exprimindo falsa simpatia, enquanto a intenção oculta e real é revelar a
inferioridade do outro para salientar a própria superioridade.
Incoerência – dizer uma coisa e fazer outra.
Acaba com a credibilidade, gerando descrédito e desrespeito. A Palavra
Impecável assume responsabilidade por suas convicções e só promete o que tem
certeza de poder – e querer – cumprir.
Pregar um princípio e defender atitudes contrárias com dois pesos e duas
medidas faz a pessoa sustentar o protecionismo do “ aos meus, tudo; aos outros,
nada”.
Reclamações - esse padrão aplica rótulos
negativos a situações ou pessoas, com a intenção e se justificar ou se
engrandecer. É óbvio que não se trata aqui de se manter passivo e tolerar situações
inadequadas ou ofensivas. Mas tudo depende de como essas falhas são apontadas.
Neste caso elas serão objetivas, impessoais e direcionadas para a mudança em
questão - e não voltadas para o ataque pessoal.
Queixas – quase sempre acompanhadas de
ressentimento vitimizador, com pessoal / falsa(?) interpretação de fatos , a
projeção de uma mente condicionada a ver inimigos por toda parte, para
justificar seus fracassos e poder se colocar como certa e superior. Pode descambar
para a raiva, que vai ruminando o diálogo interior e acaba envenenando a pessoa
que, no final, até se perde de onde tudo começou.
De toda forma, elas sempre buscam nutrir um sentimento de superioridade, pois
nada fortalece mais o ego do que estar “certo”.
Toma por verdade e compartilha informações que alguém afirmou sobre um
terceiro, deturpando-lhe a palavra que, à custa de repetição cria um rótulo que
acaba se aderindo a pessoa e se torna "verdade" oficial de um
personagem.
Tagarelices - identificadas com o fluxo
incessante da Mente que não quer calar, transmitindo pensamentos compulsivos,
pois parece se sentir incomodada com a própria Presença. Precisa fugir do
confronto com o mistério da sua própria solidão. Não tendo algo relevante a ser
dito, apenas se distrai com o ruído da própria voz e as sucessivas cascatas de
relatos e comentários sem conteúdo importante. Conhecido como “jogar conversa
fora”.
Fofocas – a satisfação em mostrar que
“sabe” o que o outro desconhece, que vai passar uma informação, dar uma
notícia, não importa se boa ou má. Pode vira acompanhada de um falso tom de
compaixão ou solidariedade, mas bem no íntimo carrega em si uma crítica velada
e a sensação vitoriosa de “comigo não aconteceu” , colocando-se numa posição de
vantagem.
Insinua-se como veneno sorrateiro até usando como alvo pessoas que diz amar,
pois a intenção primordial é captar a atenção e a aprovação de quem ouve.
Pode conter os elementos ciúme e inveja. Se alguém tem mais ou sabe mais, nosso
ego se sente ameaçado, diminuído e procura se recuperar menosprezando e
reduzindo o valor da capacidade do outro. Tenta depreci-a-lo aos olhos dos
demais.
Toma por verdade e compartilha informações que alguém afirmou sobre um
terceiro, deturpando-lhe a palavra original que, à custa de repetição cria um
rótulo que acaba se aderindo a pessoa e se torna "verdade" oficial de
um personagem.
Feitiços – comentários e opiniões
emitidas por pessoas que prezamos já geram, por si, influência. Muitas vezes
uma palavra tendenciosa já é suficiente para captar nossa atenção à ponto de
mudar o nosso foco e alterar os fatos. No momento em que nela acreditamos sem
examinar outros aspectos, ela se perpetua como parte do nosso sistema de
crenças, transformando-se em veneno. Daí a importância da imparcialidade. Á
partir de um certo nível de Consciência emancipada, já passam a ser nocivas as
associações de natureza “tribal” como ideologias, partidarismos e demais
corporativismos próprios da mente adolescente, à moda do “um por todos, todos
por um”.
Xingamentos – é mais um rótulo sobre
pessoas e situações que exprime nossa necessidade de triunfar. Linguagem chula
e palavras de baixo calão são a expressão mais primitiva de quem não tem o que
argumentar e são incompatíveis com a boca que se propõe comunicar com o Divino.
Verbalizar reforça a intenção e acessa o pensamento, dentro do campo energético
correspondente.
Esses pontos
recorrentes são uma sugestão e permanecem em aberto para outras questões que
eventualmente surjam no prosseguimento desses estudos.
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